Bruno Franklin Barbosa, Jhon Marulanda e Gabriela Figueiredo
1.1. Introdução ao assunto
"Nada na biologia faz sentido exceto à luz da evolução", já dizia Dobzhansky. Tudo o que você é e faz remete a um longo e constante processo de seleção daquilo que determina seu sucesso de sobrevivência e geração de descendentes. Essa é a máxima de todos aqueles que estão fadados a transcrever proteínas em nosso planeta, como você, eu, seu cachorro, aranhas, sapos e vírus que atingem proporções mundiais e colapsam nações. Darwin e Wallace foram os prodígios que viveram no tempo que precisavam viver. Além de estarem a par dos emergentes estudos que demonstravam os desígnios da evolução nos seres, realizaram suas próprias investigações em aventuradas jornadas, e por fim, defenderam corajosamente a realidade da evolução por seleção natural. Hoje, o legado de Darwin e Wallace são admirados em todas as ciências, e somos agraciados com novas ferramentas e tecnologias para nos aprofundarmos nesse assunto.
Os insetos, a maior biomassa animal do planeta, são muito antigos e distribuídos no globo, oferecendo uma grande variedade de grupos acessíveis para observações de perto. Esses fatores, assim como seu ciclo de vida curto, fazem com que os insetos sejam um valioso grupo para estudos evolutivos e biogeográficos. O quanto rios, montanhas e oceanos derivam várias espécies a partir de uma?Como essas barreiras naturais inferem na biodiversidade conhecida hoje? Foi sempre assim? Já temos respostas para essas perguntas, mas a interminável jornada de pesquisa só tem a elucidar esse conhecimento, não só para determinar a linha temporal dos insetos e todos os seres vivos, mas também dar sentido a todo mecanismo fisiológico e adaptativo que determina a relação dos seres no planeta.
1.2. Aplicações:
1.2.1. Biogeografia cladística
A biogeografia cladística, também conhecida como vicariante, surge da união do sistema filogenético proposto por Willi Hennig com a perspectiva de Croizat, buscando padrões de distribuição coincidentes. A pergunta central deste campo é: “por que os organismos apresentam a distribuição atual?”, e existem duas respostas possíveis para ela: (i) elas sempre estiveram neste local ou (ii) elas existiam em uma outra área e alcançaram a distribuição atual por meio de dispersão. (i) se relaciona com hipóteses envolvendo uma mudança conjunta entre espaço e a espécie em foco; já (ii) relaciona-se com movimentos migratórios aleatórios ou direcionais.
Para se realizar uma análise biogeográfica cladística é necessário obter cladogramas de áreas, isso é possível através da substituição dos terminais de um cladograma taxonômico pelas suas áreas de ocorrência. Assim será possível visualizar se cada grupo se restringe a uma área específica e vice-versa, ou se existem processo migratórios afetando sua distribuição. Se não houver coincidência entre os padrões observados é necessário utilizar metodologias adicionais para resolver esta questão.
Em um estudo publicado em 2019, Riccieri et al. construíram uma árvore filogenética para compreender a relações entre as espécies de besouros-bolha do gênero Hycleus (Meloidae) e inferir os processos biogeográficos por trás de sua diversificação, avaliando a taxonomia e classificação. Para isso foram utilizados dados de sequência de genes mitocondriais e nucleares obtidos de 125 espécies.
Anteriormente ao estudo, o gênero se dividia em três “seções” e em 45 grupos de espécies “fenéticas” (de acordo com a morfologia). Contudo, após as análises foram identificadas quatro linhagens principais, incluindo espécies pertencentes a outros dois gêneros: Ceroctis e Paractenodia (Figura 1). Portanto, ambos os táxons são agora chamados de Hycleus como novos sinônimos. As três seções descritas de Hycleus são polifiléticas e foram rejeitadas, enquanto vários grupos de espécies representaram clados bem suportados.
Figura 1. Gêneros focados no estudo: Hycleus, Ceroctis e Paractenodia.
O artigo conclui que Hycleus provavelmente se originou na África durante o Mioceno Inferior (~ 20 Mya), e subsequentemente se espalhou na Europa e na Ásia Ocidental. Mais tarde, no final do Mioceno (~ 6 Mya) um Saharo- O grupo Sindian se ramifica a partir da linhagem paleártica, enquanto a Região Oriental foi colonizada após um evento de dispersão através da Península Arábica da Região Afrotropical (~ 5 Mya) (Figura 2).
Figura 2. Proposta de distribuição biogeográfica do gênero Hycleus.
1.3. Vídeos complementares
“The early evolution of insects - Russell Garwood”
“Why Do More Species Live Near the Equator?”
1.4. Sites úteis
BIOFECUNDA: “Biogeografia: desvendando a história da distribuição da vida no espaço”
MONGABAY: “The matrix matters: scientists find surprising biodiversity between forests”
1.5. Leituras complementares
Gressit, J. Linsley. Insect Biogeography (1974.). Annual Review Of Entomology, Annual Reviews. http://dx.doi.org/10.1146/annurev.en.19.010174.001453.
1.6. Referências
Riccieri, A.; Mancini, E.; Salvi, D.; Bologna, M.. Phylogeny, biogeography and systematics of the hyper-diverse blister beetle genus Hycleus (Coleoptera: meloidae) (2019). Molecular Phylogenetics And Evolution. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.ympev.2019.106706.
Lomolino, M.V.; Sax, D.F. & Brown, J.H. (2004); Foundations of biogeography: classic papers with commentaries; The University of Chicago Press, Chicago and London.
Nelson, G. & Platnick, N.I. (1981); Systematics and biogeography: cladistics and vicariance; Columbia University Press, New York.
Figuras 1 e 2: Gabriela de Figueiredo Jacintho.
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