Os vaga-lumes começaram a brilhar há mais de 100 milhões
Por: Douglas Ferreira
Por muitos anos as seguintes hipóteses foram muito bem aceitas: os vaga-lumes (família Lampyridae) iluminam o céu principalmente para o acasalamento (1), como também para alertar predadores para não esperar um deleite saboroso (2). Os cientistas há muito tempo debatem qual propósito desencadeou a evolução do brilho aéreo do besouro. Seria a hipótese 1, ou a 2, ou quem sabe as duas?
Esse brilho produzido pelo vaga-lume nós chamamos de bioluminescência, uma oxidação biológica gerada no curso de seu próprio metabolismo. A luminescência ocorre nos órgãos fotogênicos (órgãos produtores de luz fria) situados no final do abdome dos vaga-lumes.
A bioluminescência é gerada por reações químicas altamente exotérmicas, catalisadas enzimaticamente, nas quais a energia das ligações químicas de compostos orgânicos é convertida preferencialmente em luz visível. Nas células fotogênicas estão contidas moléculas da proteína Luciferina que são catalisadas pela enzima Luciferase ao entrar em contato o oxigênio, transformando-se em moléculas de Oxiluciferina produzindo luz, o brilho que nós vemos. A luz emitida pode ser de diversas cores, variando do amarelo ao azul.
Figura. Esquema reduzido da reação onde a Luciferina, presente no organismo do vaga-lume, é oxidada por oxigênio molecular e essa reação é catalisada pela enzima luciferase, dando origem a oxiluciferina mais a luz que conseguimos enxergar.
A luz produzida é fria e sua eficiência é estimada em 92 a 100%, isto é, quase todo o fluxo radiante é composto por radiação luminosa. Mas não precisa se preocupar, pois essas moléculas quando perdem energia produzem luz e não calor, quando você chegar perto de um vaga-lume ele não vai te queimar! Uma outra curiosidade é que se compararmos com uma luz de lâmpada elétrica, ela possui 10% de eficiência e a do sol apenas 25%. Incrível a eficiência de luz produzida pelos vaga-lumes, né?
Figura. Larva, pupa e adulto de vaga-lume com o final do abdome brilhando (bioluminescência).
Videos:
Agora que entendemos como funciona o processo de produção de luz nos vaga-lumes, porque que eles resolveram brilhar?
Para tentar desvendar esse mistério, recentemente, o pesquisador Gareth Powell (Universidade Brigham Young, em Provo, Utah) e seus colegas examinaram a fundo as histórias evolutivas dos vaga-lumes e seu grupo irmão luminescente, os besouros-de-clique (família Elateridae).
Através da extrapolação de oito exemplares de fósseis de besouros com idades conhecidas, os autores conseguiram estimar quando as outras espécies surgiram. Eles então construíram a famosa árvore genealógica dos vaga-lumes que sugeria uma data de origem para a bioluminescência do inseto.
E pasmem, eles chegaram na grande descoberta que gerou até uma matéria na revista Nature (renomada revista científica). Eles desvendaram que vaga-lumes e besouros-de-clique começaram a iluminar o céu cerca de 133 milhões e 105 milhões de anos atrás, respectivamente. Essas idades sugerem que os insetos brilharam muito antes de seus atuais predadores aéreos – morcegos e pássaros – existirem.
Como os vaga-lumes adultos começaram a piscar antes que os seus predadores voadores representassem uma ameaça, os autores inferem que sua luminescência evoluiu como um sinal sexual.
Figura. Comparação de estimativas de tempo de divergência para nós que representam as origens da bioluminescência terrestre (linha verde) e aérea (linha azul) e com idades de origem de clado publicadas para potencial existente (preto) e grupos de predadores extintos (cinza). Os tempos são escritos para Opiliones, Anura e Araneae devido a restrições de idade e figura. As linhas verticais pontilhadas representam intervalos de 50 milhões de anos (Retirado de Powell et al., 2022).
Então, agora você já sabe que a grande descoberta da vez é que os vaga-lumes adultos desenvolveram seu brilho primariamente para atrair parceiros e não para afastar predadores. Qual descoberta você acha que vai ser a próxima? Deixe aqui seus comentários!!
Confira outras matérias do grupo e fique por dentro do fascinante mundo dos insetos!
Referências:
Powell, G. S., Saxton, N. A., Pacheco, Y. M., Stanger-Hall, K. F., Martin, G. J., Kusy, D., ... & Bybee, S. M. (2022). Beetle bioluminescence outshines extant aerial predators. Proceedings of the Royal Society B, 289(1979), 20220821.
Gallo, D., Nakano, O., Silveira Neto, S., Carvalho, R. L., Baptista, G. C. D., Berti Filho, E., ... & Omoto, C. (2002). Entomologia agrícola.
Cranston, P. S., & Gullan, P. J. (2008). Os Insetos: um resumo de entomologia. Editora Roca Terceira Edição, 440, 02-03.